Ao longo da história da educação, a ênfase no desenvolvimento intelectual muitas vezes obscureceu a importância crucial da dimensão afetiva no processo de aprendizagem.
No entanto, à medida que avançamos no entendimento das complexidades do cérebro humano através da neurociência educacional, torna-se cada vez mais evidente que as emoções desempenham um papel central na construção do conhecimento.
A afetividade, compreendida como um conjunto de experiências, vínculos e interações interpessoais, emerge, assim, como um pilar fundamental para o sucesso educacional do estudante.
Um dos aspectos mais significativos da afetividade na educação é a criação de um ambiente seguro e acolhedor, onde os alunos se sintam livres para explorar, questionar e cometer erros sem medo de julgamento.
A valorização individual e o estímulo à construção de uma autoestima positiva não só promovem a confiança em si mesmos, mas também alimentam a disposição para enfrentar desafios e superá-los.
Conforme Henri Wallon, em sua teoria do desenvolvimento infantil, a afetividade e a cognição são processos integrados.
Essa teoria coloca em destaque a interconexão entre afetividade e cognição, defendendo que a segurança emocional é a base para o desenvolvimento de habilidades cognitivas eficazes.
Wallon não apenas reconhece a relevância da dimensão emocional, mas também enfatiza a interdependência entre afeto e cognição, ilustrando como esses processos se influenciam mutuamente ao longo da vida humana.
Para Wallon, a afetividade não se limita a meras emoções, mas sim constitui um conjunto de relações interpessoais que moldam o desenvolvimento do indivíduo.
As interações sociais, desde o nascimento, são essenciais para a formação da personalidade, da identidade e da capacidade de aprendizagem.
A segurança emocional, proporcionada por um ambiente acolhedor e por relações afetivas positivas, permite que a criança se sinta confiável e segura.
Essa sensação de segurança é fundamental para que ela possa explorar o mundo, se arriscar e aprender com seus erros.
Ao contrário de uma visão tradicional que colocava a cognição como um processo isolado e racional, Wallon propõe uma visão holística do desenvolvimento humano.
Afetividade e cognição são processos interligados e complementares, que se influenciam mutuamente e contribuem para a formação integral do indivíduo.
Quando os alunos se sentem reconhecidos e valorizados em sala de aula, seu interesse pelas atividades propostas naturalmente aumenta.
A presença de uma conexão afetiva entre professor e aluno não só torna o processo de aprendizagem mais prazeroso, mas também lhe confere um significado mais profundo, incentivando a autonomia e a responsabilidade dos estudantes em relação ao próprio desenvolvimento.
Lev Vygotsky, por meio de sua teoria sociocultural, enfatiza a importância da interação social e da mediação na aprendizagem.
O autor destaca o papel do professor como um facilitador afetivo do processo educacional, que guia o aluno na Zona de Desenvolvimento Proximal – ZDP.
A ZDP é a área em que o aluno, com a ajuda de um mediador mais experiente, é capaz de realizar tarefas que ainda não consegue fazer sozinho.
O professor, como mediador, utiliza ferramentas e estratégias para auxiliar o aluno a superar seus limites e alcançar novos níveis de conhecimento.
A escola, como um microcosmo da sociedade, desempenha um papel fundamental na formação de indivíduos empáticos e colaborativos.
Através da promoção de relações afetivas saudáveis entre os alunos, é possível cultivar um ambiente de respeito mútuo e cooperação, onde cada estudante se sinta parte de uma comunidade educativa.
Para Freire, a afetividade é a seiva que nutre a aprendizagem.
Ao contrário de uma visão tradicional e fria da educação, Freire reconhece a centralidade da afetividade no processo de aprendizagem.
A valorização das emoções, sentimentos e vivências individuais cria um terreno fértil para o conhecimento florescer.
Em sua teoria do apego (Attachment Theory), John Bowlby evidencia como os primeiros vínculos afetivos, especialmente entre mãe e filho, têm um impacto profundo no desenvolvimento emocional da criança, fornecendo-lhe a base necessária para futuras interações sociais e aprendizagens.
A Teoria do Apego de Bowlby oferece uma lente poderosa para compreender como as experiências de vínculo na infância moldam o desenvolvimento social, emocional e cognitivo da criança.
Essa perspectiva tem implicações significativas para a prática educacional, especialmente na sala de aula.
O professor assume um papel decisivo como figura de apego secundária na vida da criança, complementando o papel dos pais.
Ao criar um ambiente seguro e responsivo, o professor pode promover o desenvolvimento de um vínculo afetivo seguro entre ele e seus alunos.
Para Jean Piaget, pioneiro no campo do desenvolvimento cognitivo infantil, a afetividade e a aprendizagem estão intimamente ligadas e se influenciam mutuamente.
Ele argumenta que a afetividade não é apenas um fator externo que impacta a aprendizagem, mas sim um componente essencial do processo cognitivo.
As emoções, sentimentos e relações interpessoais desempenham um papel fundamental no desenvolvimento da inteligência e na construção do conhecimento.
Para Piaget, a afetividade é de suma importância para a aprendizagem.
A sala de aula ideal, segundo essa perspectiva, é acolhedora e segura, com respeito à individualidade, interações positivas, aprendizagem significativa e gestão das emoções.
O professor, nesse contexto, utiliza estratégias como círculos de diálogo, aprendizagem cooperativa, jogos e feedback construtivos para criar um ambiente de aprendizagem rico e estimulante, onde os alunos se sentem motivados a explorar, aprender e crescer.
Conclusão
A afetividade não deve ser vista como um mero complemento, mas sim como um elemento intrínseco e indispensável para o processo de aprendizagem.
Ao integrar plenamente a dimensão emocional à prática educativa, é possível criar ambientes de aprendizagem mais acolhedores, estimulantes e eficazes, onde os alunos se sintam seguros, motivados e engajados em sua jornada rumo ao conhecimento e à autonomia pessoal.
Maurilio Jarduli é colunista do Blog GALILEU, atuou como Conselheiro Pedagógico por 15 anos, e é pós-graduado em Gestão Estratégica/Governança Corporativa – USP.